Célia Rabelo faz show perfeito
- Josê Edmar Gomes (texto e fotos)
- 2 de abr. de 2018
- 5 min de leitura
Atualizado: 21 de out. de 2022

Celia Rabelo no palco do Arte na Praça: bela voz e muita competência artística
O show que deveria ocorrer na tarde/noite de 3 de fevereiro, acabou ocorrendo em dose dupla na noite de 24 seguinte, quando o palco do Projeto Arte na Praça foi ocupado por dois artistas de grande expressão, cujos shows causaram inesperado impacto na plateia, principalmente nas pessoas que não os conheciam.
Aliás, causar impacto para Célia Rabelo e Angelo Macarius é tão normal quanto o contrário. Ela vem de experiência musical de mais de 30 anos, tendo participado e acompanhado as diversas fases da cena musical de Brasília e tem experiência também no exterior, onde já mostrou e mostra o valor da nossa MPB, como uma de suas melhores intérpretes.
Angelo Macarius, por sua vez, é um dos artistas mais inquietos do atual cenário do rock e, seu último álbum, lançado em 2014, recebeu rasgados elogios da imprensa especializada da capital, que o considera um compositor e arranjador criativo e original.
Na noite de 24 de fevereiro de 2018, os dois artistas uniram-se para apresentar os shows da 24ª edição do Projeto - que seria apresentado por Célia Rabelo, dia 3 de fevereiro, mas teve sua realização inviabilizada por um temporal – e da 27ª edição, cujo show principal foi comandado por Angelo Macarius e sua banda Fusion.

Beto Gonzales, Célia Rabelo, Alex Paz e amigos após o show, na Praça das Artes
CÉLIA – A musa da MPB de Brasília foi a primeira a se apresentar e trouxe, consigo músicos maravilhosos, também. Um deles foi o violonista Félix Junior
.
Célia começou o show pegando pesado. Atacou logo de Pra Lennon e McCartney, a imaginária canção composta pelos célebres mineiros Fernando Brant, Márcio e Lô Borges e imortalizada por Milton Nascimento, em 1970, no LP Milton.
Em seguida vieram se agente falasse menos, talvez compreendesse mais (Congênito), do não menos genial Luiz Melodia e o Lindo lago azul, de Gonzaguinha, além de Upa, Neguinho! (de Edu Lobo e Gianfrancesco Guarnieri, composta em 1967) e outras joias do repertório de Elis Regina.
Mas quando começaram os acordes de Tico-tico no fubá (choro composto por Zequinha de Abreu, em 1917, e imortalizado mundialmente na voz de Carmem Miranda), muita gente não resistiu e foi dançar em frente ao palco.
A festa prosseguiu ao som de Coisas do Brasil (Guilherme Arantes), Menina dança (Moraes Moreira) e outros sucessos que bateram fundo no coração do público.
No final, a qualidade vocal e a técnica interpretativa de Célia Rabelo ficaram evidentes quando ela cantou Eu e a brisa, ícone da MPB de 1967, de autoria de Johnny Alf, que é um dos pilares da bossa nova. E assim, o show terminou e voltamos todos à realidade.
Mas, antes que as energias do palco se dissipassem, Célia falou ao Folha da Serra sobre Sobradinho, música de Brasília e o projeto Arte na Praça.
Durante o show, ela já havia comentado que Sobradinho é uma cidade especial, com muito verde e gente boa. E citou o sapateiro Paulinho, que atende na Feira Modelo e não põe preço no serviço. “É o cliente que paga o que acha que vale”.
Nascida na área do antigo Colégio Agrícola de Planaltina, a cantora revela que conviveu com vacas e outros bichos e Sobradinho, com suas paisagens bucólicas, traz sua infância de volta. Mas, apesar disso, ela não costuma ouvir a música sertaneja, que atualmente invade a mídia.
“Eu sei que tem sempre alguém correndo atrás de alguma novidade, algum estilo, mas o sertanejo não é o que eu ouço em casa e no carro”, revela.
Gosto musical à parte, Célia reconhece que em Brasília tem sempre alguém fazendo alguma coisa de qualidade, compondo e gravando, por isso ela não acredita que a trajetória musical do DF tenha sido interrompida com a morte de Renato Russo e Cássia Eller.
A cantora, no entanto, alerta que a teoria de Cazuza (Exagerado) não pode ser levada ao pé da letra. “Todo excesso acaba sendo prejudicial. Por causa do excesso, acabamos perdendo dois ícones da cultura de Brasília. Mas a roda precisa rodar; a chuva precisa chover e o sol brilhar. A vida é assim”, resigna-se.
O Projeto Arte na Praça, para Célia Rabelo, “é uma iniciativa maravilhosa, que tem que continuar”. Ele conta que nas praças de Belo Horizonte tem música ao vivo sempre e, aqui no DF, Sobradinho é a única cidade que consegue fazer o mesmo.
“Sei que isso está sendo possível, graças à participação do deputado Ricardo Vale. Só por isso, eu votaria nele novamente”, revela.
Sobre o futuro, Célia conta que planeja lançar um novo single e pretende passar uma temporada no exterior. Tomara que não demore muito...a voltar.

Feliz Junior ao lado de Célia Rabelo: Parceria perfeita entre violão e voz (Foto :Alfredo Bessow)
FELIX JUNIOR - A crítica especializada considera este mineirinho simpático como a revelação do violão sete cordas no Brasil. Ele é compositor e arranjador da MPB instrumental.
Tudo começou com ele tocando com o pai, aos 9 anos, em Pirapora. Aos 14, uma música sua conquistou o 4º lugar no 2º Festival Nacional do Choro. No ano seguinte, mais duas composições do garoto prodígio alcançaram o 2º e 3º lugares, no mesmo certame.
A partir daí, Félix ganha o mundo e representa o Brasil no Festival de Música Internacional de Santiago de Cuba e do Festival Bandolins de La Coruna - Espanha, em 2004. Ele toca, ainda em Bogotá, na Colômbia. A partir de então, sua experiência internacional só ampliou, assim como o reconhecimento, Brasil a fora.
É esta fera, que lidera o trio musical que acompanha Célia Rabelo. Após, o show do dia 24 de fevereiro, na Praça das Artes de Sobradinho, Félix Junior também falou ao Folha da Serra sobre a música de Brasília e sobre as praças.
Felix acredita que, depois de Renato e Cássia, o cenário musical de Brasília não parou, mas mudou. “Apareceram vários estilos. A música instrumental, por exemplo, cresceu muito e Brasília recebe artistas de vários lugares”, observa.
Para o violonista, o rock ganhou ainda mais espaço. Ele observa, também, que não é a onda sertaneja que causa estragos na cultura de Brasília e do Brasil, mas os modismos.
“Não é só em relação ao sertanejo, não. Em todas as áreas estão empurrando coisas para agente engolir. A mídia não está preocupada em veícular produtos de qualidade e isso tem consequências”, pontua o músico.
Para Félix, quando a mídia divulga, sem nenhum critério, determinado produtos, como os funks com letras agressivas, que cultuam a violência, há o perigo da imitação de comportamentos questionáveis, principalmente pelos jovens.
“A partir do momento que isso vira o principal produto cultural da mídia, as pessoas absorvem sua mensagem e podem ficar alienadas”, lamenta o violonista.
Junior, no entanto, louva os referenciais culturais de Sobradinho, como o Bumba-meu-boi, o samba da Bola Preta, a capoeira e as festas tradicionais do entorno, “que influenciam o nosso jeito de fazer cultura”.
Ele entende que esses referenciais deveriam estar mais explícitos nos shows do Arte na Praça, mas vê com muito bons olhos o Projeto, que ele gostaria de ver multiplicado. “Moro em Sobradinho e gostaria de não ter que sair daqui para trabalhar, mas faltam iniciativas como o Arte na Praça para dar trabalho aos artistas locais”, finaliza o músico. (José Edmar Gomes)
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