AVELINO NETA RAMOS Se existir somente duas pessoas que amam esta cidade, eu sou uma delas
- Edmar Gomes
- 11 de mar. de 2017
- 4 min de leitura
Atualizado: 21 de out. de 2022

“Já se viam chegados junto à terra,
Que desejada de tantos fora,
Ora, sus, gente forte, que na guerra
Quereis levar a palma vencedora,
Já sois chegados, já tendes diante
A terra de riquezas abundante”
(Os Luzíadas, 7º Canto, de Luís Vaz de Camões)
Em 1953 aportou-se no cais do Rio de Janeiro o marmorista lusitano Albino Pires Diaz Ramos, oriundo da região do Covão do Coelho, localidade a Noroeste de Portugal, próximo à cidade de Coimbra. Especialista no trato ao mármore, veio em busca de novas oportunidades nas terras brasilis, de onde sempre ouvia histórias de emigrantes que foram bem- sucedidos aventurando-se na segunda pátria.
Dois anos depois, em 1955, desembarcou no Rio o restante da família Ramos, a esposa Maria dos Anjos Jorge da Neta, as filhas Tereza e Noêmia e o menino Avelino, nessa época com apenas nove anos, juntos foram morar em Nilópolis e o chefe da família conseguiu emprego na S.A.RIO, Sociedade Anônima Rio, empresa especializada em serviços de marmoraria.
Com a construção da Nova Capital do País, promovida pelo saudoso presidente Juscelino Kubitschek, a S.A.RIO, onde Albino trabalhava, foi chamada a prestar serviço no Planalto Central, em 1957. O operário lusitano, especializado em mármore deixou sua marca nas grandes obras de Brasília.
Vila Planalto
Mais uma vez, a família foi dividida. Somente em 1960, já em abril, mês da inauguração da Capital, o ‘Clã Ramos’ se reuniu novamente e foi morar provisoriamente no acampamento da empresa, na Vila Planalto. O garoto Avelino, que trabalhava com o pai, desde os 11 anos, conseguiu uma vaga no escritório da empresa.
Após a erradicação dos acampamentos de operários, com o término das obras, em 1961, começava a surgir as cidades-satélites, como Taguatinga, Gama, Núcleo Bandeirante. A família Ramos escolheu Sobradinho e fixou residência na Quadra 7, Conjunto C, Lote 14.
Com residência definida, a vida do ‘Clã’ foi se transformando para melhor. O garoto Avelino que antes só havia estudado por pouco tempo, no Rio, em Brasília não teve muita oportunidade para continuar os estudos, a rede pública de ensino começava a ser implantada e ele tinha que trabalhar para ajudar no orçamento familiar.
Ensino fundamental
Com toda família em Sobradinho (1962), ele reiniciou o aprendizado no Ginásio Industrial de Sobradinho, onde as aulas eram ministradas à noite, com luz de lampião. Com muita dificuldade, conseguiu cursar todo o ensino fundamental, no local onde hoje funciona o Centro de Ensino Fundamental 3, da Quadra 6. A conclusão do Curso Científico se deu no Colégio de Sobradinho, atualmente Centro de Ensino 2.
Já integrado à comunidade sobradinhense, o agora adolescente lusitano mantinha a perseverança dos grandes navegadores, descobridores do novo mundo, trabalhava à tarde, estudava à noite e combinava o curso científico seriado com o cursinho preparatório para o vestibular. Foi assim que, em 1968, viu coroado todo o esforço e sacrifício de anos de luta com a aprovação no vestibular do medicina, da Universidade de Brasília.
Cinco anos depois conclui os estudos acadêmicos com especialidade em pediatria, realizando a residência médica no Hospital de Sobradinho, que funcionava como Hospital-Escola e pertencia à FUB, Fundação Universitária de Brasília.
Dasp
O jovem médico não perdeu tempo. Através de concurso público, promovido pelo Dasp - Departamento Administrativo do Serviço Público - conquistou vagas como pediatra, médico do trabalho e também na Fundação Hospitalar, na área de pediatria, sendo lotado no Hospital Regional de Planaltina, atuando por três anos.
Lá participou do importante Programa Saúde Integrada, convênio entre a Fundação Hospitalar, Universidade de Brasília e Fundação Kellogg, quando foram criados os agentes comunitários de saúde, que realizam trabalho de integração de suma importância em todas as regiões do País.
SMI
Em 1979, a FUB, que gerenciava o HRS, em regime de comodato, devolveu o hospital para Fundação Hospitalar, a comunidade viu, alarmada, as portas da unidade se fecharem.
Foi nesse momento que o filho do senhor Albino e dona Maria dos Anjos e mais quatro médicos formaram uma Comissão que assumiu o comando da unidade.
O secretário era Jofran Frejat, que deu total apoio aos novos gestores. Na época, teve inicio a implantação do sistema de saúde do DF. O HRS cresceu, na qualidade e expansão dos serviços e a cidade ganhou também três novos centros de saúde.
O médico Miguel Jorge foi nomeado para direção geral e dr. Avelino ficou com o cargo de diretor do SMI, Sistema de Medicina Integrada. Em 1989, ele foi nomeado diretor-geral e sua gestão se estendeu até janeiro de 1995.
Materno Infantil
No período de 79 a 95, foram registradas belíssimas conquistas na unidade, como implantação da residência médica, Ortopedia, UTI, Caps, creche dos servidores, primeiro hospital do Centro-oeste reconhecido pelo Unicef como ‘Hospital Amigo da Criança’ e primeira unidade dessa região a participar da gestão da qualidade em saúde.
Completando seu tempo de serviço público, o dr Avelino de Neta Ramos aposentou-se, mas continua contribuindo com saúde serrana e do Distrito Federal, sempre presente aos debates e com sugestões criativas.
O trabalho médico de assistência à comunidade continua na Clínica Materno Infantil, fundada por ele, na Quadra 1. Quando se refere a Sobradinho é taxativo: “Se existir somente duas pessoas que amam essa cidade, eu sou uma delas”.
Saga
Quase sete décadas depois, o operário português da construção civil, especialista em mármore, Albino Pires Diaz Ramos, e sua esposa, Maria dos Anjos Jorge da Neta, não se encontram mais entre nós.
Mas a saga da família Ramos continua nas mãos dos três filhos: dr. Avelino de Neta Ramos, médico pediatra, drª Noêmia da Conceição Neta Ramos Barra, endocrinologista e a economista Maria Tereza Ramos.
A vida se renova sempre em desafios futuros e como escreveu o poeta Fernando Pessoa, ‘tudo vale a pena quando a alma não é pequena’.
(Antônio Caetano - escribaplanalto@ibest.com.br)
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