ANGELO MACARIUS Um andarilho que vem dos anos 70
- Jose Edmar Gomes
- 1 de jun. de 2017
- 3 min de leitura
Atualizado: 21 de out. de 2022

Capa do CD "O Andarilho" de Angelo Macarius lançado em 2015 contendo 10 faixas.Trabalho musical que confronta o rockzinho de shopping
É no mínimo surpreendente o que se ouve no CD Andarilho, do roqueiro brasiliense, Angelo Macarius, que é oriundo da banda Lotus Negro, que ele mesmo fundou em Sobradinho, em 1994 e nela permaneceu até 2011, quando decidiu alçar voo solo.
Macarius nasceu no Plano Piloto, mas mudou-se para Teresina, terra de suas avós, aos quatro anos e lá permaneceu até os sete, ouvindo o que elas cantavam no coral da igreja e ao piano, as cantigas de roda e trabalho das quebradeiras de coco e os aboios dos vaqueiros e as toadas do bumba-meu-boi, ao mesmo tempo em que arriscava seus primeiros versos nos cadernos escolares.
Dos registros de sua adolescência, certamente, vêm os versos da toada Boi de Osiris (faixa 6 do CD), onde ele entoa: Negra era a noite/Era o açoite/Para a alma e para o coração/Broto de flor nordestina/Campesina do sertão.
Do Piauí, aos 18 anos, Macarius voou para Alto Paraíso já profundamente impactado pela primeira edição do Rock in Rio. Depois veio a identificação com o Barão Vermelho, o próprio Cazuza e o mergulho definitivo no rock brasiliense após o advento da Legião Urbana. Era preciso viver rock. E ele fundou a Lotus Negro, com quem gravou seu primeiro CD.
Com sua banda percorreu os quatro cantos do DF e entrou definitivamente para a cena roqueira brasiliense, já cheia de outros tantos talentos e bandas memoráveis. Fez e aconteceu até que decidiu voar sozinho e produzir Andarilho.
FILOSOFIA
Quem ouve Andarilho é remetido diretamente aos anos 1970 e suas canções, na verdade, parecem trilhar as estradas por onde passaram Raul Seixas e outros bichos-grilos, que embarcaram no último trem do sertão.
Alguns se perderam pela estrada. Outros ainda estão viajando, como Macarius, que faz “perguntas profundas e assustadoras, divinas e malditas”, como ele canta em Estrada (faixa 9), um das fortes canções do CD, que foi jogada para o final do disco, quando deveria iniciá-lo, pois conceitua bem o discurso do artista.
Aliás, Macarius mira na filosofia, literalmente, quando em Zaratustra (faixa 10), composta por um certo Tilopa Mercúrio, canta: Ele sobe a montanha/Ele escuta lá do alto/Em silêncio as engrenagens/Rangem os apelos. Parece Nietzsche conversando com sua serpente, sua águia e brigando com o sol. Se é que vocês nos entendem.
Aliás, a busca pelo papo-cabeça é uma constante no disco e o compositor mergulha novamente no universo do filósofo alemão, na mesma Estrada, quando canta: Conversei com a lua nas festas/Escutei a canção da floresta/Toda a cidade/pareceu-me miragem... Realmente, parece que Macarius também nasceu “há dez mil anos atrás”.
POESIA

Angelo Macarius pela lente do fotografo Mauricio Oliveira
Mesmo que as “viagens” de Macarius, às vezes, desconectem seus versos da poesia e tornem seu discurso gratuito, como em Abismo (faixa 3): Um louco canta melodias/A inocência como guia/Com potência e poesia/Anuncia um novo dia/Para os que vivem em solitude(sic).
Ou até planfetário quando descamba para a crítica política e acaba cantando frases soltas, que não têm força estética... nem política: ...Da astúcia de alguns/Da maquiada reforma/Do monumento central/ Sustentáculo da feira/Que não merece o desprezo. (em A Feira da Torre – faixa2)
Ele supera a desorientação vocabular e algumas contradições semânticas e o poeta se reabilita em versos como: Não tem mistério/Tudo ao contrário/Primeiro a ira/Depois o beijo/Primeiro escarro/Depois desejo(em Tudo Torquato – faixa 5) ou quando canta: Trevas sabem/ Que o dia sempre vem/ Cada dor guarda êxtase maior/Muito além do mal ou do bem (em O Andarilho –fauxa 8).
PEGADA
A partir daí, o disco cresce com a pegada do cantor, com a competência da banda, que tira um som puro, com raízes nos ditos anos 70, mas focado no viço do rock brasiliense, fazendo de Andarilho um disco original, anárquico, ao mesmo tempo poético e instigante.
A inquietação que alimenta os versos das canções de Andarilho (ou Procurando Por Deus) vai muito além do rockzinho de shopping -aquelas musiquinhas que usam roupas de grife e maquiagem discreta, que se tem ouvido ultimamente em Brasília - e entra na fértil seara da legítima música brasileira/brasiliense, onde pontificam Sérgio Sampaio, Cazuza, Renato Matos, Titãs,Cássia Eler, Russo e o pessoal do Capital Inicial e outras feras federais.
Pena que as rádios não toquem tais canções.
Contato para shows :
Email : angelomacarius@gmail.com
Tel : (61)995950939
コメント